15 de julho de 2009

Longe e sózinho

Agarro as abas do casaco, puxo a gola ao pescoço, o vento é tanto, sinto frio, tenho vontade de chorar mas não é da ventania que me bate nos olhos, são saudades.
A rua está deserta.
É só uma rua cinzenta, larga, uma avenida que aos poucos e conforme a desço se vai alastrando, os passeios de um extremo ao outro cada vez mais distantes.
É só uma rua e eu.
Estranho não haver prédios, carros, gente, barulho. Talvez encontre as crianças que costumam brincar no passeio, aí estarei a salvo, sei que não estarei perdido.
Mas o vento é tanto que quanto mais ando mais longe fico. Para onde vou não sei, choro, tenho saudades de tudo, principalmente de mim, parece que me perdi no outro passeio mas está tudo tão distante que não consigo avistar-me.
É só uma rua, uma rua que me engole e me entrega ao anonimato completo.
Choro, quero ser alguém, quero encontrar-me outra vez, a partir daí sei que encontro os miudos e tudo estará correcto, certo, o vendaval pára e volto a sentir a brisa morna que costuma haver nesta rua cinzenta.
Desperto ofegante, ainda a gemer e a choramingar.
Estou longe de casa, longe de tudo. Acho que tenho medo.

14 de julho de 2009

Consolo(do regresso)

Estranha sensação esta de abrir a boca, trazerem-me o garfo à boca, enrolado no garfo uma massa italiana ligeiramente rija, saborosa, sinto o cheiro ácido de tomate. Isto é mesmo bom, quero mais.
Sinto as garfadas a prosseguirem o seu caminho até à minha boca, só não vejo a proveniência, há-de haver algures um prato desta comida, quente, consola-me, é vermelha tingida do tomate, tenho a certeza, mas a mão que guia o talher não é a minha. Tão pouco tenho os olhos abertos, como consigo ver o que como e me sabe tão bem?
Acordo.
Quase sinto o gosto da pasta que sonhei...
Envergonho-me mas também me dá vontade de rir. Babei-me.
(1º Sonho desde que regressei a casa)

13 de julho de 2009

Reblogo, logo estou vivo

Regresso.
E fico satisfeito por ainda ter vontade de aqui voltar e escrever, por saber que houve quem não esquecesse este modesto bloco-notas de um homem que muitas vezes não tem a certeza da realidade, sobre a sua existência enquanto individuo no mundo que o cerca, sobre a sua sanidade mental, sobre o acordar finalmente de um sonho que o atormentou por tantas horas.
Volto aos meus relatos de sonos percorridos entre corredores que não sei onde vão dar, nem se têm préstimo algum, quer sejam para mim, quer para quem generosamente se dá ao trabalho de aqui passar e me ler.
Chego ao que me parece a minha (outra) casa. Senti saudades.
Não volto diferente ou curado dos pesadelos, ou mesmo aliviado sobre a quantidade de sonhos. Não, continua tudo na mesma forma.
Só eu mesmo, o Anónimo é que regresso. Estou vivo.

6 de maio de 2009

Quase mentira, quase verdade

Escrevo aqui tudo o que sinto, o que me incomoda e o que me satisfaz. É um acto orgânico, tão necessário como comer. Passou igualmente a ser um vicio, pois quando não o faço tomo notas, seja em que papel for ou até em circunstâncias que parecem menos próprias.
Passei a aceitar este lugar como a extensão de mim mesmo. E os outros também: Incentivam-me, pedem-me conselhos como orientar a sua vida, preocupam-se quando não está actualizado e até o chefe já me disse que me tornei outro homem desde que criei isto.
É tudo verdade.
Há uma clarividência nos meus actos, não me engano nem tomo atitudes incorrectas. Creio que tenho um dom e ele foi-me revelado através do blog.
Só tenho que escrever, escrever sempre muito e todos os dias. Sei de antemão quando aqui me visitam e pedem que os visite. Sinto que faço parte da vida deles e eles contam comigo, não posso falhar.
Mas começo a ter medo. Medo de não conseguir dormir e não sonhar ou deixar de ter pesadelos. Se a insónia aparecer lá se vai a galinha dos ovos de ouro, ou seja a estima e consideração que me reservam, a inspiração que serve de inspiração aos outros.
Acordo transpirado.
Abro a janela. Está uma lua enorme e amarela lá no alto. Por instantes fecho os olhos, a imagem é tão misteriosa que me pergunto se o que vejo é ainda o sonho, uma alucinação ou é mesmo a noite com a lua tão cheia.
Desligo o portátil que ficou esquecido no sleeptime.

5 de maio de 2009

Voltei (a mim)

Tudo tão branco e macio, muito agradável aos olhos, ao toque. Sinto-me bem, tenho vontade de rir e fazer piadas, pôr os outros a rirem do mesmo que eu. Eles riem só de me verem sorrir, sem nada de concreto, apenas boa disposição.
Não sei quem é esta gente mas sinto-me bem entre eles e parece que sou muito popular, tratam-me bem, dão-me palmadinhas no pescoço e nos ombros, procuram que eu esteja perto deles.
Ela chegou elegante, de branco como tudo o resto, vem a sorrir, é tão bonita quando sorri.
Dá-me a mão, encosta a cabeça ao meu peito, ficamos assim juntos, os outros felizes por nos verem felizes.
Não sei quem é esta mulher bonita mas sinto-me à vontade com ela... É estranho, ninguém fala e no entanto ouço eles falarem, a mulher a dizer-me frases de amor, parece que os diálogos se constroiem dentro da minha cabeça e todos podem participar, dar opinião, concordar sem haver a necessidade de fazer o som para articular as palavras.
Beijo a mulher na testa, ela fecha os olhos e diz-me está bem. Mas só o diz dentro da minha cabeça, tranquila, pacifica.
Acordo com as notas que tenho andado a escrever ao lado da almofada, a luz acesa.
Ouço um grilo lá fora. Ou uma cigarra, não sei. Sei que gosto deste som. Acho que regressei a mim. Não sei explicar isto de outra maneira.
Amanhã vou trabalhar.

4 de maio de 2009

Registo 3

Mais uma nota. (Isto devía ir tudo directamente para o lixo!)
Li o que escrevi - muito em cima do joelho - e parece coisa de drogado.
Não vou voltar a fazer o que fiz, é preferível aguentar a insónia. Hei-de dormir, o sono há-de ser mais forte. Afinal o ser humano tem de dormir, obrigatoriamente, os nossos ciclos são assim: em alerta e em repouso.
Volto a lembrar-me do B., mas continuo sem ter a memória fotográfica necessária para o visualizar.
Sinto-me triste, mas não da mesma forma como tenho andado a sentir a tristeza, quase uma auto-comiseração. Sinto pena de não termos mantido o contacto. A vida tem umas voltas bizarras e retorcidas. Tentei retomar o contacto com um morto.

3 de maio de 2009

Registo 2

Estou pedrado. Devo estar. Sinto-me lento e tenho uma sede terrível, a lingua seca. Estou um pouco confuso. Desliguei o telemóvel. Mas agora estou com algum receio: Se me acontece alguma coisa...
Isto é tudo estúpido, estou para aqui a tentar escrever coisas com nexo quando nem para mim o fazem.
Tenho sono, muito sono.

2 de maio de 2009

Registo 1

Pedi uns dias antecipados de férias.
Continuo sem dormir.
Não me apetece escrever no blog. Aliás não me apetece nada. Deve ser assim que as pessoas começam a entrar em depressão.
Não tenho opção: Vou mesmo tomar um drunf. Ou até dois.

1 de maio de 2009

Com assinatura

Lá fora o cão, umas pessoas que riem alto e guincham, o som baço do rádio do carro que martela um ritmo constante. Dói-me a cabeça. Dói-me a cabeça como se fosse explodir. Lembro-me de um pesadelo recorrente que me aflige até às lágrimas, em que jorro sangue sem conseguir descobrir por onde. Acabo por perecer não pelo esvaír mas por me afogar no meu próprio sangue.
Quase temo que a cabeça me exploda e o sangue suje as paredes.
Esta noite, como de há quinze dias para cá a insónia. A maldita insónia.
Desta vez sei qual é a causa para não conseguir dormir. O bizarro disto tudo foi ter ido à procura de razões para a origem da insónia, achar que ao descobri-las era a solução para acabar de vez com elas. Ou pelo menos, entender o meu pesadelo da rua cinzenta.
No fundo, bem cá no fundo acho que sempre soube. Talvez por isso tenha arranjado desculpas para mim próprio para não encarar aquilo que inconscientemente já sabía.
Não se trata de intuições, sextos sentidos nem premonições. Não sou dado a esse tipo de coisas e na verdade nem sei se acredito nelas, mas cá dentro de mim havía qualquer coisa que me atrasava...
Saber agora que o meu amigo de infância morreu em 2006 foi e é, um duro golpe.
Não vou aqui contar o como, não altera nada e devo-lhe a ele e a mim também essa privacidade.
Não sei se me dói a cabeça por não conseguir dormir se por fazer tanta força para me lembrar do rosto dele e não conseguir.



PS.: O som é para ti B.

18 de abril de 2009

À capela

Tive um serão agradável: Um grupo de antigos colegas juntamo-nos, como o fazemos todos os anos pela Primavera. Falamos do tempo de escola, de Coimbra, das republicas, é assunto obrigatório e recorrente. Falamos do que fazemos actualmente, dos que não apareceram, especulamos, rimos, comemos e bebemos. No final, os fados de capa negra.
Regressei a casa com uma paz imensa e a trautear o que ouvira.
Recolhi-me e ferrei no sono.
Destaparam-me, puxaram-me por um pé e caí redondo no chão.
Toda a entrada do quarto estava vedada por uma barreira de homens enormes envoltos em capas negras. Um som de capela silvou e eu tapei os ouvidos, fechei os olhos, mas à medida que o entoar se mantinha estável, modulado, quase palpável comecei a sentir uma admiração enorme por quem cantava.
No meio deles, o meu colega de escola, o miúdo de calções, joelhos feridos, a imagem cinzenta no seu todo. Lembro-me de lhe ter pedido desculpa por não o procurar. A voz dele elevou-se à dos outros. Até se extinguir o som e a sua figura cinzenta.
Acordei tranquilo, uma sensação de perdão, o coração calmo.
Vou procurar o meu amigo de infância, devo isso a mim mesmo.

17 de abril de 2009

Caminhadas

Deitei-me de estomago ainda cheio. Já sei que isto não dá bom resultado, mas sentía-me sonolento e achei que não devía perder a oportunidade.
Adormeci profundamente, como uma pedra.
Até aí tudo bem. O pior foi ter acordado enjoado, transpirado, uma sensação de vómito que não dá para aguentar. Mas aguentei. O sono é que não voltou.
E por isso, desta vez resolvi fazer uma coisa que nunca fiz: Saír de casa, ir à procura do cão que ladra a meio da noite, andar, cansar-me, qualquer coisa para ocupar o tempo e o espirito.
Chovía, não muito, mas aquela morrinha que ensopa a roupa.
Passados vinte minutos estava de volta a casa.
Tomei um duche quente, deitei-me e adormeci como um bébé até ao dia seguinte. Se sonhei não me lembro de nada.
Não encontrei o cão e tão pouco o ouvi ladrar.
Estou como novo!

16 de abril de 2009

Outras vidas?

A mulher de rosto de cera e lábios vermelhos olha-me tristemente sem mover um músculo.
Eu passo várias vezes à porta onde ela se mantém direita, mãos traçadas sobre a roda do vestido, passo sempre como se andasse num carrossel, mas não às voltas, é um movimento igual ao de atravessar infinitamente uma rua ao volante de um carro, em ritmo lento, tudo se passa em ralenti, só eu estou a uma velocidade real assim como os olhos tristes dela.
Ao redor tudo está destruído, sem cor, só os lábios vermelhos muito intensos numa cara de tanto sofrimento.
Passo sempre sem parar, sem conseguir parar junto a ela, pedir-lhe para não ficar triste, que venha comigo.
Sinto no peito a dor dela, o silêncio dela.
Quando acordo sinto-me amargurado. E de repente recordo-me de todo aquele estranho silêncio que temi quando estive fora e vejo que o meu medo era porque já o havía experimentado antes neste sonho recorrente.
Por um lado fico contente de achar uma ponte entre estas duas dimensões. Por outro, assaltam-me ideias de vidas reencarnadas... Será que eu já conheci a mulher do meu sonho noutros tempos e o silêncio do quarto de hotel despertou a minha vida passada?
Sinto-me estranho. Amargurado como já disse.
E ouço o cão no seu ladrar solitário. Lembro-me de ter tido saudades de o ouvir e neste momento não quería nada ouvi-lo. Nada mesmo.

15 de abril de 2009

Confidências

Tenho andado estes dias a passar as notas que tomei aquando da minha última viagem aqui para o blog.
Inicialmente tinha pensado compô-las, mas agora acho que toda a terapeutica deste sitio tem exactamente a ver com a realidade e crueza com que tenho passado para aqui todos os sentimentos e emoções que me possuem quando sonho, quando as insónias me põem as mãos a tremer ou até mesmo quando choro por os pesadelos serem demasiado para os aguentar, duvidando se são ou não materialmente vividos.
Talvez o objectivo inicial disto tudo se tenha perdido um pouco no espaço e no tempo, mas a verdade é que me sinto impelido aqui a vir, se não sempre, pelo menos quando o bichinho da blogesfera me chama (já me tinham avisado e eu não quis acreditar...)
Foi esta também uma forma de descobrir que há outros que também se afligem com os mesmos pesadelos; Não que isto me compense, mas deixei de me achar um anormal e principalmente, retirei todo o pragamtismo analitico que os profissionais durante anos a fio me incutiram (e me raparam do bolso!).
Se a minha natureza é sonhar, sofrer com os pesadelos, pois que seja, mas pelo menos que me dê consciência e tino suficientes para os poder descrever da melhor forma que sei.
Não sou escritor, serei um contador do que se atravessa nas minhas horas de dormir, e se o anonimato se impõe pelas circunstâncias da vida, que não se considere tal como uma cobardia mas uma necessidade de não me olharem de modo diferente apenas porque confesso o que de tão intimo se passa comigo.

14 de abril de 2009

Pernas para que vos quero

São só pernas, enormes, esguias, de um tom dourado e brilhantes como se estivessem cobertas de um pó de ouro que reluz. São pernas tão altas que dá para eu passar por baixo delas como se fossem uma ponte.
Apetece-me olhar para cima... Nem que seja num relance.
Imagino como será... Se tem pernas deste tamanho, proporcionalmente... Como será?
São pernas que se cruzam atrevidamente, fazem curvas e ângulos, atiçam o meu desejo de lhes tocar, apertar, afastar.
Eu conheço estas pernas mas não sei de onde.
Desperto e sei que estou a sorrir. Já sei de onde conheço estas pernas gigantes: São da interprete alemã que esteve aqueles dias a trabalhar comigo.
Não era uma mulher atraente mas tinha um par de pernas de caír para o lado.
Aninho-me: Talvez agora consiga sonhar com o resto do corpo. E pôr-lhe um rosto mais simpático e afável do que o que na realidade tinha.

13 de abril de 2009

Azul claro

Chamo-a várias vezes, não se volta, aos meus olhos o detalhe do roupão azul claro a arrastar pelo chão, os ombros bem destacados numa espécie de nevoeiro que a vai engolindo. Grito, talvez não me tenha escutado, mas prossegue sem se virar e no entanto eu sei cá no fundo que me ouve tão distintamente quanto se estivesse ao meu lado.
Estranho que venha para a rua com o roupão azul claro. A minha mãe não é destas coisas, deve ter acontecido um problema qualquer para vir para a rua nesta roupa. Pergunto-lhe: caminhando sempre, responde-me baixo e eu ouço-a, não pára, não se vira para me olhar e explicar porque está vestida desta forma em plena rua, capaz de encontrar outras pessoas para além de mim, comigo não faz mal mas os outros que irão pensar?
O nevoeiro acompanha-a como uma moldura, um contraste esbatido entre o claro do azul e o leitoso transparente.
Lembro-me deste roupão quando eu era miúdo e ela vinha ao meu quarto sossegar-me tarde da noite, abraçar-me e dizer que eram pesadelos. Talvez me deva deitar aqui mesmo, assim ela virá e olhará para mim e abraça-me e acaba-se com isto tudo.
Deito-me no passeio da rua, deixo de a ver, ao nevoeiro, à bainha do roupão azul claro a arrastar.
Há gente que se aproxima de mim, envergonho-me.
Acordo hirto, destapado. Muito assustado.
Tenho tantas saudades da minha mãe.

5 de abril de 2009

A (minha) casa

Como é agradável regressarmos a casa, saber onde estão as nossas coisas, tudo certo, tudo com a nossa marca.
Tenho a certeza que hoje vou dormir.
Passei mais uma vez a barreira do meu próprio medo quanto ao viajar pelos céus (Acho que nunca me vou habituar...), tenho os pés na terra firme, na minha casa, no meu mundo cheio de barulhos pequeninos que me fazem sentir vivo. Engraçado que nunca me tinha apercebido como me são importantes para o equilibrio emocional. Só por isso já mereço dormir como uma pessoa normal.
Amanhã vou ao escritório, entrego os relatórios, faço a reunião e depois férias. Uns merecidos dias de descanso pela semana pascal.
(Não vou acabar com o meu blog. Sería de uma grande estupidez desperdiçar estes meses. Ignorar-me. E até mesmo aos que tiveram paciência suficiente para me lerem e aconselharem, que embora sendo no virtual, melhor coisa teríam para ler sem ser a mim e às minhas loucuras)

4 de abril de 2009

Saudades

Tanta vontade de dormir tinha que obviamente resultar em asneira: adormeci profundamente por duas horas, um pouco mais, depois a espertina, este maldito silêncio que me põe os nervos num feixe.
Se estivesse em casa àquela hora da madrugada decerto ouviría o cão a ladrar. Aquele som triste que me deixa melancólico, triste, saudoso. Acho que tenho saudades daqueles uivos lamentosos... Aqui não há nada, nem cães, nem pessoas que se sintam vivas.
Parece que dormi para acordar para um silêncio de morte.
Não quero voltar a ficar neste hotel. Como é lugubre tanto silêncio!

3 de abril de 2009

Muito sono

Ainda não são 10 da noite e estou cheio de sono. Sono daquele de querer dormir, tapar-me, sentir o calor e deixar-me ir.
Esta noite vou mandar às urtigas a revisão dos apontamentos sobre a reunião de hoje e a de amanhã.
Nem me apetece apontar seja o que for nestas notas...
(Última questão: Será que tudo isto tem algum préstimo? Se calhar ando para aqui a escrever sobre coisas que devería esquecer, não lhes dar importância. Talvez deva fechar o blog e parar de procurar razão para os meus pesadelos)

2 de abril de 2009

Out

Não faço a minima idéia se foi o pânico de não dormir ou a ameaça de me drunfar que me pôs a dormir, mas lá que dormi, isso é bem verdade.
Sem sonhos, sem pesadelos.
Aliás, parece que dormi a correr: lembro-me de me deitar e de acordar hoje com o telemóvel.
O entermeio nestes dois tempos é de memória nula.
E apesar de tudo sinto-me tenso, apreensivo.

1 de abril de 2009

Escolhas

Se esta noite voltar a maldita insónia tomo a pastilha do costume.
Não posso arriscar outra noite.
Hoje estive cansado, e tive que fazer o dobro do esforço para não perder as orientações que trazía como trabalho de casa, os objectivos a atingir e especialmente não me pôr a divagar sobre a interprete de olhos verdes e pernas de 1,50m. (Donde é que esta mulher apareceu?!).
Sei que se tomar a pastilha mágica entrarei num bolha que me isola de tudo. O problema é sempre o dia seguinte, o encortiçado que me apanha o raciocinio, a lingua, os movimentos.
Mas ou é isto ou sujeitar-me a um vexame pela forte hipótese de não voltar a dormir e começar a ter alguma alucinação em plena reunião de serviço.

31 de março de 2009

Quarto de hotel

Nunca fiquei neste hotel.
Não é mau, é confortável, os empregados têm a delicadeza habitual dos germânicos, gestos de cabeça acompanhados de um esboçar de sorrisos, tudo muito limpo e distante. Digo eu, habituado ao comportamento dos latinos...
O quarto é simples: cama fofa, almofadas tamanho XXL (demasiado moles, sinto a cabeça a afundar), alcatifa creme, sofá vermelho escuro, cortinas pesadas da cor da alcatifa, secretária, cadeira, plasma, telefone, frigobar e uma casa-de-banho toda em mármore imaculadamente desinfectada.
Não me falta nada e parece que tudo me falta.
Falta o sono chegar, aquela sensação de cansaço no corpo que nos faz apetecer deitar e aconchegar entre a roupa com o nosso cheiro, depois de um dia de trabalho.
Tive um dia cheio, muito cheio e embora tenha ficado toda a noite anterior sem fechar os olhos sei que estive focado e não me saí mal.
Mas nem mesmo esta sensação de dever cumprido me relaxou o suficiente para me apetecer recolher, apagar a luz e descansar. O silêncio de novo. Se desligar o plasma desligo o mundo.
Sou só eu e esta insónia: Uma mulher exigente que reclama continuamente o meu corpo até à minha alma.

30 de março de 2009

A viagem

A viagem fez-se normal, os meus receios habituais sobre os aviões foram isso mesmo: Habituais.
Para além destes, a expectativa sobre o hotel, o quarto. Eu sei que pensar demasiado no que estará para chegar é um pouco como o perú e morrer de véspera, mas se as minhas noites são o que são num ambiente que me é familiar, não se pode achar descabido que as adivinhe hostis num sitio que não é o meu.
A primeira noite, fria, muito, muito fria, entregou-me uma insónia daquelas de estalar.
Havía um silêncio que se ouvía. Um silêncio frio, quase morto, quase nada.
De repente senti-me o único vivo daquele hotel, nada se escutava, nem água a correr nas torneiras, nem pés cuidadosos de empregados, tão pouco alguém que se animasse num quarto perto.
Quando chegou a hora de abrir a porta, quase estranhei ver outras pessoas na sua rotina habitual. O meu colega elogiou o sossego, a noite bem dormida e o consequente sucesso garantido na reunião que iríamos ter. Fui incapaz de lhe revelar como fora a minha noite.
E por isso mesmo, resolvi todas as noites tomar notas sobre as minhas noites.
Não são textos literários, são apontamentos sobre o meu comportamento, o que me rodeou, os sonhos e claro, os pesadelos.

24 de março de 2009

Mais uma

São 4,22h.
Entre tantas esta é apenas mais uma noite de insónia.
Sinto-me estranhamente calmo e ao mesmo tempo a tremer por dentro. Não sei a que atribuír esta espertina: Não tomei café ao jantar, não me aborreci e não tive mais problemas para resolver para além do habitual. As coisas no escritório vão a uma velocidade normalissima e nem mesmo a viagem que farei dentro de dias me tem apoquentado (eu gosto de viajar, o mal são os aviões).
Li o que escrevi ao longo destes meses por aqui.
Na verdade, acho que se não soubesse que isto são tudo coisas por que passei, acharía que quem escreveu isto, no minimo, precisava de tratamento. Ou até internamento.
Começo a pensar que sou um perigo para mim próprio... Se não tivesse sentido na carne os horrores de cada um dos pesadelos que sofri diría que isto tudo que por aqui vai, não passa de um argumento para um filme passado num manicómio, e que na vida real, não podería acontecer.
Mas aconteceu. Senti e doeu-me. E como tudo na vida, tenho mais tendência para me lembrar dos pesadelos do que dos sonhos. Já os tive, bons e bonitos.
Talvez deva escrever aqui apenas os sonhos, esquecer os pesadelos e as insónias, fazer de conta que só sonho cor-de-rosa.
Este foi mais um registo de ver as horas a passarem. São 6,05.
Estou cansado.
Estou com sono mas a vida está à minha espera.

23 de março de 2009

Zero

Uma caixa de cartão simples, sem mais nada, parda, no topo as badanas semi-levantadas. Espreito para o seu interior: Cheia com uma pilha de papel branco. Debruço-me, acho estranho tanto papel sem nada escrito. Quando aproximo a vista constato que estão preenchidas com números. Números e mais números enfileirados, carreiras, linhas compactas de números desde o topo até aos extremos.
Não entendo estes números, o que são, o que querem dizer, o que se pretende que eu faça deles.
Folheio a pilha de papel apertada na medida da caixa, não consigo tirá-la para fora, todas as outras folhas estão repletas de números.
Estes números vão aumentando de tamanho. Deduzo que na última folha do monte há-de estar apenas um único algarismo.
Tenho para mim que há-de ser o 8, que é o meu favorito.
Mas não: São apenas dois zeros um por cima do outro, separados por uma ligeira distância entre eles.
São um oito desligado, penso, se os juntar hão-de ser de novo o meu número da sorte.
Com o indicador empurro o zero de baixo na direcção do de cima. Faço uma ligeira pressão para que se mova até se unir ao outro zero.
Insisto, raspo com a unha, arrasto, nada. Teimoso, faço força usando todos os dedos.
O papel fura-se, separa-se num rasgão e agora os dois zeros estão mais afastados do que nunca. Sei que nunca terei sorte, condenei a minha sorte às minhas próprias mãos.
Quando acordo tenho o coração a bater num compasso violento, uma angústia não só por mim mas por todo o quarto, quase sinto, por toda a minha vida.

22 de março de 2009

Incurável

A rua está no sitio dela, cinzenta, ventosa. Só é rua porque eu estou lá e faço dela um sitio de medo. Não sei de quê. Até os garotos me assustam, sinto sempre receio de lhes ver os joelhos esfolados, encadear-me no sangue em fio em contraste com a falta de outras cores que pareço não conseguir fabricar.
Mas só neste sonho.
Nos outros, mesmo naqueles em que é tudo branco e não consigo ver, não há a ansiedade deste, a empurrar-me ao longo da rua onde cada promenor parece ferir-me a vista: as pedras da calçada, a falta de outros para além de mim e dos miúdos, passadeiras de peões, que a qualquer momento se tornam grades de cárceres horizontais que me hão-de engolir sem a esperança de que o grito que solto há-de acudir outros e os outros me hão-de dar a mão.
Aos poucos trago para esta rua, camufladamente, gostos que gostaría de ter tido. A mulher do quadro que de quando em vez se escapa ao meu encalce, o meu amigo de infância a quem perdi o rasto.
Tenho andado fora, muito por fora do que é entendimento racional e aceite.
Os pesadelos voltam, num ciclo vicioso sem se alterarem no conteúdo e sem me darem tréguas ao esquecimento. Quero pensar noutras coisas e não consigo, tenho medo de dormir, tenho medo de não conseguir dormir, tenho medo de não acordar.
Até que ponto remexer nos sonhos e pesadelos não os dimensiona?
Até que ponto esquecer kem dorme não é um passo atrás nas escadas que venho a subir aos poucos para entender - estou certo - o que é incurável?

9 de março de 2009

Night and Day

Do palco escuro a boca vermelhíssima dela sob o spotlight parece iluminar todas as palavras que diz, Night and Day, convenço-me que canta para mim e fá-lo de uma forma perfeita.
Os que estão presentes neste salão comentam que ela canta para mim.
Tenho o coração acelerado, canto para mim as mesmas palavras da melodia e tudo parece fazer sentido, sinto-me como pertencendo a este ambiente faustoso e de permamente festa em que nada tería o mesmo brilho se eu não estivesse aqui.
É uma sensação de bonomia saber que somos queridos e que fazemos a diferença.
Ela sai do palco e senta-se numa mesa distante na companhia de um homem que desconheço, olho-a, espero a qualquer instante que ela venha até mim, me pegue na mão, me fale num inglês adocicado, sei o que me há-de dizer, digo-o silencioso muitas vezes, talvez assim ela chegue mais rápido e deixe o homem que parece diverti-la.
Admiro-a: as curvas do vestido comprido envolvem-lhe as pernas e o tronco, o cabelo, a boca vermelhíssima tudo é semelhante a uma moldura que a fecha na sua beleza.
Sorrio, sei que me castiga, que me quer deixar ansioso, mas não consegue, a música que cantou foi para mim, Night and day you are the...
O ambiente enche-se de rolos de fumo azulado adensando um mistério bom, sou especial, ela é minha, até os outros o dizem, e sempre a música a confirmar esta ligação, é um inuendo, não é descarada, exibida, é daquelas relações que os outros suspeitam e comentam sem certezas.
Acordo com o meu próprio som de voz a cantar Night and Day, sorrio, rio. E depois penso que ela no meu sonho não chegou a regressar à minha mesa, que podería ter sonhado um bocadinho mais até ela se sentar perto de mim, só mais este bocadinho e tería sido perfeito.

8 de março de 2009

Ufa!

Uma palavra de reconhecimento e gratidão por todos quantos aqui vieram na minha ausência.
Trabalho e blog não combinam.
E do primeiro tenho tido fartura até ao enjoo.
Quisera que todas as insónias e pesadelos se fartassem de mim... Mas não, andaram por cá na dose do costume.
Na semana que entra conto-vos. E visito-Vos.

20 de fevereiro de 2009

Toalhas vermelhas

Quando chego à minha mesa de trabalho é que vejo que me levaram o portátil, a agenda, todas as minhas coisas.
Os meus colegas estão sentados nas suas secretárias, tudo normal, ninguém me diz nada.
O chefe aponta-me o dedo, não fala, mas percebo que quer que vá junto dele e à medida que me aproximo aquele dedo toma proporções gigantescas, ocupa um espaço imenso, tapa-lhe a cara, todo ele é um indicador monumental, o resto do fisico desapareceu por completo, só aquele dedo gordo e grande ocupa a sua mesa, a sua posição de chefe.
Aproximo-me mas vou-me esquivando aos movimentos sob pena de ser atingido e esborrachado.
Todos os outros se mantêm nos seus lugares, ninguém parece achar esta situação anormal, só eu me interrogo como o dedo do chefe cresceu tão desmesurada e perigosamente.
Perto dele penduro-me no indicador, sinto-me transportado até uma secretária mesmo ao lado da do chefe, é a minha nova mesa de trabalho, o meu pc, as minhas coisas, a agenda aberta no dia com as reuniões marcadas, tudo está ali.
O dedo senta-me e volta à mão do chefe, ao tamanho normal, a um indicador com unha, pêlos nas costas da mão. O chefe mete as mãos nos bolsos e toma o seu lugar.
Não entendo porque estou ao seu lado. Nem tão pouco por que razão a minha mesa tem uma toalha de veludo vermelho a cobri-la, o material disposto por cima, não é suposto haverem toalhas a cobrirem secretárias num local de trabalho. E no entanto, aliso-a.
Acordo suado, o pijama colado ao corpo mas estou gelado.
Quero rir-me da estupidez do que sonhei mas não sou capaz.
Daqui a pouco menos de 3h vou ver o chefe.

19 de fevereiro de 2009

Sem sono

Levei o dia inteiro a lembrar-me do sonho que tive com a mulher do retrato.
Gosto de o lembrar, gostaría mais se tivesse mesmo chegado à fala com ela.
Aliás, pensei que isto já me tinha passado... Há algum tempo que ela não aparecía nas minhas noites. Mas a noite passada anunciou-se e foi muito bom.
Só gostava de saber se de facto, eu tivesse naquele dia tido a sorte de me encontrar com ela, conversarmos, o que tería acontecido. Talvez o meu sonho se projectasse para o real.
E agora estou numa de insónia.
Não tenho sono e a cena do sonho não me sai da cabeça. E de outra parte do meu corpo, que teima em manifestar-se altivamente por cada vez que me salta à memória o momento de a penetrar.
Mas não estou nada preocupado.
Por isto vale a pena muitas noites em branco.

18 de fevereiro de 2009

Ela abraçou-me

Deito-me em posição fetal, parece-me que não caberei na cama de outra forma, encolho-me porque a cama encolheu, a roupa que me cobre é pequena, sei que vou passar frio.
Junto os joelhos ao queixo, abraço-me, sinto-me desconfortável, se adoptar outra posição caio, a cama há-de encolher ainda mais.
Não estou sózinho, sinto-o, mas se me mexer sei o que acontece, fico muito quieto.
É quando as mãos dela me traçam pelo peito e me aconchegam a si, os seios dela nas minhas costas, a barriga, as pernas tornam-se uma sensação quente, boa, de alivio, a cama aumenta, temos espaço.
Permaneço abraçado por esta mulher desconhecida, quero-lhe bem, quero-a sempre na minha cama, quero amá-la como um homem quer uma mulher, não me importa não lhe conhecer o rosto.
Penetro-a, devagar, sinto todo o meu sexo a entrar sem fim, sempre, continuadamente.
Tenho um prazer intenso por saber que ela o tem, mesmo sem lhe ver a cara, espero que ela atinga o orgasmo, depois eu, espero tudo e há sempre aquela sensação de estar a entrar nela devagar, uma coisa infinita, sublime.
A mulher nas minhas costas aperta-me o peito, não sei como a cópula se deu estando ela nas minhas costas, volto-me e vejo a mulher do retrato.

17 de fevereiro de 2009

A teoria do sono (polifásico)

O sono polifásico é um padrão de sono alternativo no qual o tempo dedicado ao descanso pode ser reduzido até duas horas por dia sem causar danos à saúde. Ele é atingido pela separação do período de sono em momentos mais curtos e espaçados.


Os críticos do sono polifásico preocupam-se com a possibilidade deste padrão de sono restringir o tempo gasto como os estágios perimetrais do ciclo do sono, podendo assim perturbar o ritmo circadiano do corpo. Isso poderia causar o sofrimento dos mesmos efeitos negativos encontrados na privação do sono, como perda da capacidade cognitiva e habilidade física, incluindo stress, ansiedade e enfraquecimento do sistema imunológico. Contudo, não existem estudos que comprovem o efeito negativo do sono polifásico.


Os críticos apontam a dificuldade que algumas pessoas tem de respeitar os curtos intervalos de sono, acabando por dormir para além do programado como uma evidência da insustentabilidade deste padrão.


Adeptos do sono polifásico frequentemente testemunham uma mais valia no estado de alerta, mas os cépticos questionam se isso se deve mesmo ao novo padrão de sono ou se é resultado do acumular de adrenalina e cortisol ao atingirem com sucesso os seus objectivos de sono - afinal, menos sono significa mais tempo útil e, portanto, mais metas produtivas podem ser alcançadas durante o dia.


Muitos adeptos do sono polifásico relatam que a parte mais difícil deste padrão de sono é superar o aspecto social, uma vez que as horas de trabalho muitas vezes não permitem o período necessário de sono durante o dia em intervalos regulares. Relatos pessoais indicam que perder um único período pode causar consequências catastróficas, portanto muitas vezes mesmo pessoas com sucesso no sono polifásico retornam ao padrão monofásico a fim de conseguirem satisfazer a sua vida social e profissional.







in Wikipedia

16 de fevereiro de 2009

A teoria do sono (monofásico)

O padrão de sono mais comum, conhecido como sono monofásico, consiste de diversas fases, algumas das quais são desnecessariamente longas na proporção em que naturalmente ocorrem. O cérebro inicialmente resiste a períodos mais curtos e frequentes de sono, mas ao deparar-se com o padrão de sono polifásico, aprende a entrar nos estágios essenciais do sono muito mais rápido como estratégia de sobrevivência.


Este período de adaptação tende a dissipar-se em duas semanas de prática e os sintomas de cansaço são completamente superados após 14 dias. Contudo, um mau planeamento do cronograma de sono pode complicar ou frustar completamente o processo. Uma vez passado o período de adaptação, todo o equilíbrio é restabelecido e as chamadas "sonecas" passam a substituir o sono por longos períodos.







in Wikipédia

15 de fevereiro de 2009

Há luz na minha rua

Levanto-me da cama, tronco nú, afasto as cortinas e abeiro-me do parapeito da janela. Penduro a cabeça, consigo ver distintamente o fundo da rua, perto do passeio, as pedras que constituem o desenho da calçada.
Sei que é igual ao da rua cinzenta mas esta é a minha rua e assim não pode ser cinzenta, tem que ter cor, movimento, carros e a esta hora não pode ter miúdos a brincar porque é noite e é escuro apesar dos candeeiros acesos.
Esforço-me cada vez mais por achar estes sinais na minha rua, desejá-los, sentir que tenho esse poder apenas por o pensar veemente. Nada, tudo se apresenta como a rua cinzenta, o silêncio surdo que me enche os ouvidos e depois a cabeça retirando espaço aos meus desejos e à minha vontade.
Cada vez me penduro mais para o lado de fora, inverto a minha verticalidade, os pés na direcção do céu. Sei que o céu a esta hora da noite é azul muito escuro, sei-o pelos meus pés.
E sei também como um flash, que se caír haverá vermelho a manchar a calçada, o cinzento foge, há-de fugir concerteza.
Penso numa solução: Os meus pés tocam o céu e como um êmbolo de uma caneta de tinta permanente sugo o azul escuro transporto-o até à calçada e fico feliz de ser azul e não ser encarnado pela minha queda.
Acordo. Adormeci há tão pouco tempo que nem sequer desliguei a luz.

14 de fevereiro de 2009

Eu cá não sou supersticioso

É impossível falhar o dia em que sonhei isto por ter sido na noite sexta-13.
Fui convidado para um jantar de supersticiosos, com direito a tudo. Ou melhor, sem direito a nada, pois tudo o que é crendice esteve ali naquela mesa, nos seus convivas e eu, de fora, fui o contrapeso, ou seja o nº 14 a sentar-se à mesa.
Foi uma noite divertida e fora do comum. Conheci gente interessante e uma mulher dedicadíssima ao culto do azar que me fascinou.
Cheguei a casa calmo, relaxado, bem disposto. Fiz zapping, li duas linhas e adormeci.
De cada vez que alguém se levantava da mesa o número azarado caía ali como um raio, a mulher deitava-se sobre a toalha e dava à luz repondo a falta e sempre assim sucessivamente.
Ninguém interrompía a refeição ou lhe acudía, ela sabía o que fazer e em que altura parir. Não havía sangue, não havíam recém-nascidos, só o restabelecimento da ordem pelo número a evitar.
Olhava-me muito séria da sua função e das suas capacidades e quando me ergui para me dirigir ao WC espreitei-a de lá: deitou-se sobre a mesa, afastou as pernas e ajudou-se a nascer-me.

13 de fevereiro de 2009

Stress mix

Tenho andado numa azáfama terrível, alimento-me mal, não faço qualquer exercicio fisico e a qualidade do sono é nula.
Dores de cabeça, analgésicos, dores de cabeça, analgésicos, cafeína, insónia: cumpro este programa escrupulosamente.
Ontem, tive vertigens. E de novo, a sensação estúpida de "ver" a estante que está em frente da minha secretária a erguer-se um palmo acima da alcatifa.
Não digo nada, sei o que é. Já fui avisado, alertado, já experimentei os meus limites. Um dos médicos que me acompanhou há alguns anos falou em sonoterapia.
Mas não quero e tão pouco me posso dar a esses luxos.
Não serei eu o único nesta situação: alguns colegas de trabalho tornaram-se irascíveis, falam alto, um ganhou um tique de "engolir" o lábio inferior.
Não quero ficar assim.
Será que têm pesadelos como eu?
Insónias? E me vêem exactamente como eu os vejo a eles e me acham estranho?

12 de fevereiro de 2009

Bloco Notas

Este espaço da blogesfera tem uma vantagem sobre o mundo real que é o poder datar-se os dias ao bel prazer sem obrigações de cumprir a semana tal e qual ela corre.
Assim, eu que estive afastado daqui, posso fazer seguir os dias a partir do último em que sonhei ou que tive o pesadelo, sem que ninguém me aponte o dedo. Basta que hoje aqui chegue e passe os meus apontamentos ao longo deste período de ausência.
No fundo, não vem mal ao mundo por isso, as minhas notas agradecem o tempo que lhes dedico e eu muito mais.
A única questão que coloco a mim mesmo - mea culpa - é a falta que me tem feito vir aqui desabafar. É que é diferente de estar apenas comigo a rabiscar resquicios do que passei pela noite... E saber que alguns com uma paciência infinita me têm lido, comentado e ajudado (obrigado Alexandra!) dá-me um gostinho muito especial... Acho que tenho que acabar por dar razão a quem anda nestas lides com experiência reconhecida. Isto vicia mesmo.
Não parei de sonhar nem tão pouco de me sentir violentado pela dureza dos pesadelos. Mas sinto que escrevê-los é como sangrar uma bomba que precisa de ser ferrada para funcionar de novo.
E isso dá-me alento.

11 de fevereiro de 2009

Perseguição (dois)

Envergonha-me publicamente, todos os meus colegas presentes na reunião assistem, nem um se levanta a meu favor.
Sinto-me péssimo, tento falar sobre o trabalho que faço, como me empenho, mas a admoestação continua, o atraso na entrega dos relatórios, sempre os relatórios, todos os dias os relatórios, digo-lhe para comer a merda dos relatórios, que uma empresa não se faz só de escrevinhar relatórios.
Perante a minha revolta, o chefe levanta-se na ponta da mesa, cresce, ergue o braço e desgraçadamente vejo que tem um coto.
Acho que acordei com o meu próprio berro... Não consigo entender de onde vem esta fixação, mas tenho de descobrir, isto dá cabo de mim.
O pior é que quando encarar o chefe, na vida real entenda-se, vou lembrar-me do que ele me disse, vou ter-lhe raiva, depois irei recordar-me do coto e talvez sinta nojo, ou medo, ou ambos. Não sei.
Sinto-me nauseado.

10 de fevereiro de 2009

Perseguição

Encontro-o, sorri-me, fico satisfeito de o ver, tenho vontade de o abraçar mas qualquer coisa impede-me, um receio, um arrepio.
Ele fala constantemente, faz muitas perguntas, nem sequer dá tempo a que eu lhe responda, sinto-o a olhar-me fixamente nos olhos ou talvez na testa, não sei bem, mas é uma marca profunda que crava e me incomoda. Eu não consigo encará-lo, sinto vergonha, espero que ele não se aperceba do que me vai na mente.
Sem hipótese de me esquivar ele toma-me num abraço, sinto-lhe as palmadas de regozijo nas minhas costas e sobre os ombros. Aos poucos o meu temor desvanece-se, acho-me um medricas por me ter distanciado dele quando fiquei tão feliz de o ver, rio, ele também, parou o discurso contínuo e as interrogações, liberto-me.
Confesso-lhe o que senti.
Apartados ele mira-me de novo nos olhos, na testa, ainda se ri.
Pergunta-me se o meu medo era do coto, e mostra, exibe aquela coisa horrível, deformada, a carne e o osso à vista, o braço curto, tento correr, fugir daquela imagem, mas ele segura-me pela manga do casaco. Precisamente com o coto, como se tivesse cola ou se se misturasse com o meu braço, sinto pânico, tenho medo daquilo como se fosse uma doença e agora seja eu que fique com um coto.
Do riso passa ao choro, aos gritos pela sua amputação, eu também choro, tenho medo, tenho tanto medo, não quero ver!
Choro com medo do que sonhei, sinto uma tristeza de morte.
Não vou dormir mais, prefiro passar o resto das horas até saír a andar de um lado para o outro. Assim, não volto a sonhar e a vê-lo.

9 de fevereiro de 2009

Soluções

Nado como se o ambiente liquido sempre tenha sido o meu, sem aflições para respirar, falo, gesticulo, caminho na água. É tudo verde. Um verde transparente que me faz lembrar gelatina.
Sei que penso em gelatina. E a água já não é água é gelatina, densa, algum esforço para a atravessar, chegar a algum lado.
Resolvo comer os pedaços que estão adiante da minha cara, faço-o naturalmente, desbravo o que me empecilha avançar, acho-me esperto, tão sagaz a resolver problemas. Vou sempre caminhando até me encontrar numa floresta, a folhagem muito apertada entre si como uma rede fina, uso os braços, os pés, esgaço este tecido vegetal à primeira, sinto-me rei, uma calma que me enleva e me faz subir os pés do chão.
Caminho sim, mas pelo ar, um palmo junto ao solo sem o tocar sequer com a ponta dos dedos. Olho-me, estou descalço, há areia quente em baixo, sinto-lhe o calor, depois a aproximação da água, de novo dentro dela e repito tudo, experimento vezes sem conta os elementos, sei-os de cor.
O despertador tocou, estiquei o braço, desliguei-o, levantei-me. Senti-me calmo, tão calmo e capaz de enfrentar tudo lá fora.

8 de fevereiro de 2009

Enfim dormir

Não houve outra saída. Mal senti que ela estava para ficar recorri aos drunfs. Um. Foi o bastante. Nem sequer me recordo em que altura comecei a ficar sonolento. Foi em dois tempos: do desperto para o adormecido.
Dormi, dormi e dormi.
Mas se fosse só isto era óptimo e confesso, tornar-me-ía cliente.
A questão é que no dia seguinte ando ao retardador, a cabeça parece que não funciona e fico lentinho, lentinho. Isso e a boca seca como um papel.
Só com o decorrer das horas consigo retomar o dominio total dos meus pensamentos, das reacções.
Venha o diabo e escolha.
E avarias destas só dá para fazer quando não há trabalho, compromissos, coisas que me prendam.

7 de fevereiro de 2009

Um parêntesis

Ando estoirado.
Ainda não me recompus da viagem de trabalho, estou atolado em mil responsabilidades e o sono aparece quando não deve. Ou seja, à noite, quando devería descansar não consigo. Ou porque estou preocupado e lá vem insónia ou então são os pesadelos. Até já me pus a adivinhar com que espécie de pesadelo serei brindado... Acontece é que me sinto todo dormente, a ser levado para vale de lençóis, uma necessidade de fechar os olhos e deixar-me ir nas alturas menos próprias para o fazer. A seguir ao almoço é terrível. Bebo dois cafés, lavo a cara, caminho de um lado para o outro. Creio mesmo que esta semana que passou, houve um dia em que parado à espera que o sinal abrisse, cabeceei, dei por mim com o fulano de trás a apitar furiosamente. E ainda bem, pois sendo o primeiro da linha deixei deslizar o carro e fui avançando... Se não me salvou a vida, pelo menos evitou que eu desse cabo da lata ou ficasse magoado por algum provável embate. E a coisa que menos preciso agora é de mais problemas.
Por isso, está decidido: se esta noite não adormecer como um comum mortal lá irei eu às pírulas mágicas e aí, nem que se abra o céu, mas durmo mesmo!

6 de fevereiro de 2009

Veículo de transmissão

Fecho a porta da entrada do prédio onde vivo, ouço distintamente o click do fecho, saio, procuro o carro, não o vejo, tenho a certeza absoluta de onde estava estacionado e agora não está lá.
Percorro o passeio ao longo do bairro, e já no sentido inverso apercebo-me da rua. Aquela, toda cinzenta, sem mais cor alguma.
Ando, rápido, o mesmo vento de sempre que me empurra.
Questiono-me como vim parar aqui, que o carro não o deixei aqui, mas não páro a caminhada, antes apresso o passo.
Não há mais ninguém, nada mais para além de mim, o vento, um silêncio que me entra nos ouvidos e me parece entupir.
Sinto a chave do carro no bolso, aperto-a para ter a certeza de que não é um sonho, que saí mesmo de casa à procura do carro, fico consciente que tenho de ir trabalhar e que estou atrasado e mais atrasado ficarei se não descobrir o que procuro, deve ser por isso que ando com tanta rapidez.
De repente vejo o meu carro, surpreendo-me por ser negro, não era desta cor, mas tenho a certeza de que é o meu carro, estacionado em cima do passeio de calçada portuguesa, a frente virada na minha direcção, apronto a chave e quando estou perto, a imagem dele destaca-se, distancia-se, foge-me.
Páro.
Não compreendo, parecía que estava quase a tocar-lhe...
Reinicio a marcha e acerco-me, de novo o carro mais ao longe, corro, se correr ele não terá tempo de me escapar. Mas por mais que o faça não consigo, foge-me sempre, a frente do carro recua no enquadramento da rua cinzenta.
Vejo um rosto pelo pára-brisas, as mãos no volante, reconheço uma das crianças que costumam estar nesta rua, penso em como tudo está errado, que não pode ser, que tenho de regressar à entrada do meu prédio e partir daí sem me perder nesta rua.
Acordo suado e gelado, destapado.
Agora de olhos abertos consigo ver sem enganos que quem estava dentro do meu carro era o meu antigo colega de escola.

5 de fevereiro de 2009

Olha!


Isto deve mesmo ser coisa do virtual.
É que eu comecei este blog por terapia, para cruzar experiências, para me tentar "exorcizar" de alguma forma dos pesadelos que me acompanham. E vai daí, sou premiado com este selo do Blog Maneiro!
O Black Angel é que foi o autor desta oferta inesperada.
E que me deixa um pouco à toa... Primeiro pela atribuição, depois pelo seguimento que devo dar, ou seja atribuí-lo a dez blogs selecionados por mim. Ora, a verdade é que eu não conheço essa dezena de blogs. E assim, quem aqui vier e ler os meus registos é livre de o agarrar.
Thank's Black Angel!!!

4 de fevereiro de 2009

A vingança

Não consigo valer a minha opinião. Por mais que me esforce nos argumentos, na defesa dos meus fundamentos. Sinto que tudo o que já disse é matéria de riso, melhor, de troça. E fazem-no de uma forma mesquinha repetindo todas as últimas palavras de cada frase minha e imitando o meu tom de voz.
Irrito-me, falo alto, a reacção que provoco achincalha o que estava preso por um fio.
Ameaço, fecho as mãos, dou punhadas violentas sobre uma mesa de madeira que se vai lascando à medida da minha força. Injurio-os, digo todas as asneiras que conheço.
O riso aumenta.
Nunca vejo com quem me zango, mas isso não me preocupa.
Sei que tenho poder, uso-o, amaldiçoo quem me goza, desejo-lhes a morte.
Das gargalhadas sonoras passa-se a berros estridentes, ouço pedirem-me piedade.
Sinto felicidade por saber que sofrem e o gosto da vingança é bom, muito bom.
Acordo devagar, embora o coração bata descompassado e forte. Tento aperceber-me sobre a identidade daqueles que pereceram no meu sonho, mas não encontro cara nenhuma que me revele quem eram, porque me trataram daquela forma.
Tenho um gosto amargo na boca, apercebo-me que me mordi e sangro.

3 de fevereiro de 2009

Nem tudo é trabalho

A fadiga acaba por falar mais alto.
Ao rever umas últimas notas sobre um relatório perdi a noção do meu corpo e adormeci. Papéis para um lado, o portátil aberto, a caneta caída algures.
Apareceu envolta numa mescla de cores em espiral, primeiro as mãos a passarem do ecrã para fora, muito próximas de mim, da minha gravata mais exactamente. Encolhi-me. Mas chegaram lentamente ao meu peito, as mãos espalmadas sobre a camisa, senti-as a afagarem-me os mamilos suave mas insistentemente. Depois abriu-me a camisa sem me desapertar os botões, sem me tirar a gravata, acariciou-me, brincou com os pêlos enrolando-os em pequeninos círculos, eram só mãos. E eu cravado no sofá, as costas a fazerem uma força contida para que não se apercebesse da minha aflição e surpresa.
Segurou-me o pescoço, as minhas mãos agarradas àquelas mãos.
E do ecrã surgiu todo o corpo dela. Como se fosse de borracha ou de um liquido espesso que se moldou rápido numa mulher perfeita.
Reconheci-a. Era a interprete que serviu de comunicadora na minha viagem.
Senti um certo alivio...
Sentou-se engatada no meu colo, a saia muito apertada vincou-lhe as coxas e mostrou um cinto de ligas onde estava preso um bloco de notas e um lápis tremendamente afiado. Retirou-o num gesto de mulher fatal e de lábios muito, muito vermelhos molhou-o na ponta e disse-me roucamente bitte...
Despertei com o som do telemóvel. Demorei um pouco a atender, sentía-me atordoado.
Do lado de lá uma voz quase mecânica a querer vender-me um cartão de crédito.

2 de fevereiro de 2009

De viagem

Andei cerca de duas semanas por fora, em serviço.
Escusado será referir que a maior parte do tempo a insónia foi a minha companheira... Desde a ansiedade do avião (é verdade, não é coisa que aprecie), ao cheiro dos quartos, à bendita almofada, à preocupação do negócio, tudo serviu para justificar a cabeça às voltas com as horas.
Nestas alturas as coisas mais estapafúrdias aparecem na mente como cogumelos venenosos e por mais que tenha tentado afastar estes véus negros, ainda com mais força se instalaram.
De quando em vez adormecía.
Mas nunca foi um sono reparador, o sobressalto ao despertar como se gritassem o meu nome, ou a suspeita de ter dormido precisamente na hora aprazada para algumas das reuniões ou ainda - e muito consistentemente - a queda do avião. Só isso: eu lá dentro e o avião a caír. Sempre. Repetidamente.
Conclusão: Neste momento precisava de férias. De mim, entenda-se.

1 de fevereiro de 2009

Felinos

Passeiam-se entre as minhas pernas, cada vez em maior número, tenho alguma dificuldade em movimentar-me, temo pisá-los ou que se assanhem e me cravem as unhas.
Não consigo descobrir a razão de tantos gatos ao meu redor, são mesmo muitos, silenciosos, as caudas espetadas, os bigodes eriçados e os pequenos focinhos a apontarem na minha direcção.
Embora receoso sinto que me pedem um afago.
Escolho um que me parece inofensivo, meigo, branco de dorso malhado.
Pisca os olhos verdes por cada vez que sente a minha mão a passar-lhe no pêlo. É macio, muito macio, agacho-me, aproximo-me dele, é belo, gosto da sensação que me dá ao acariciá-lo.
Os outros sentaram-se, assistem, assemelham-se a pequenas criaturas gordas vestidas de casacos confortáveis, muito solenes.
Há um silêncio perturbador nesta cena, só a minha mão se ouve a passar sobre a pelagem do meu eleito, é um som que toma proporções gigantescas à medida das minhas festas.
Páro, preciso escutar o que acontece à volta.
É com horror que vejo que o pêlo do animal se destacou das suas costas, uma folga que deixa à vista a pele rapada, peço-lhe desculpa, não o quis maltratar.
Acordo num sobressalto, acendo a luz, olho as mãos, a cama, o quarto.
Reinstalo-me, aconchego-me à roupa, sinto a moleza do sono a voltar.
Lá fora um gato solitário grita o seu amor de Janeiro.

20 de janeiro de 2009

O bolo

Palmas, muitas palmas, gente bonita, bem vestida, uma luz espectacular a conferir um glamour igualzinho ao das grandes produções da sétima arte.
Acho que conheço este sitio... Cotton Club? É, é mesmo!
Fala-se num linguajar doce, tudo muito melodioso que vai bem com o tilintar dos copos de champagne, um chic perfeito, nada de demasiado.
Dois empregados de branco-branco e negro-negro empurram um bolo da minha altura, rosa, creme, prata, inúmeras velas a cintilarem.
Sinto um fascinio enorme por estar aqui. Toda a gente bonita rodeia o bolo, aplaude, sorríem-me, estou feliz, mas tão feliz que até parece que me dói o peito, agradeço a todos, saiem-me as palavras na mesma linguagem elegante.
O discurso é interrompido por uma coelhinha que salta de dentro do bolo. Penso quem terá adivinhado este meu desejo guardado como um segredo. O salão enche-se em uníssono de um fuck, fuck, fuck.
Ela aproxima-se de mim, oferece-se, sei o que esperam de mim, agarro-a pela cintura mas todo o seu corpo tem a textura do bolo, macio, fofo, demasiado mole para o conseguir segurar, escorregadio, por mais que tente tudo se espalma nas minhas mãos, suja-me o fato, a cara, as orelhas.
O coro mantém-se inabalável e eu faço a única coisa possível: como-a.

19 de janeiro de 2009

Ainda analisando

É notória a importância que um bom sono tem para o pleno desenvolvimento das capacidades com que nos debatemos no dia-a-dia, mesmo nas actividades mais rotinadas e comezinhas.
Pois bem, para mim não é diferente, assim como também não o é o peso que os meus sonhos e pesadelos têm, a influência que causam no meu humor, na produção a nível profissional, nas relações de amizade e até de amor.
Celibatário de momento, nem sempre o fui e tão pouco o sou por convicção.
Mas é dificil acordar com a mulher com quem fizémos amor a olhar-nos apavorada por temer estar na cama de um louco ou tão só desconhecer o que se passa.
Claro que eu conto, viro-me em explicações, tento ilustrar da melhor forma as cenas que rondam os meus sonos, os períodos de insónia, os pesadelos que me tornam mudo por horas, mas deve ser muito diferente de assistir; E eu digo assistir, porque claro, a faculdade de me poder ver a mim próprio naqueles preparos eu não tenho.
Tudo isto é constrangedor. E inultrapassável.
Confesso que sinto a falta de alguém que me entenda, que não tenha medo de se deitar com um psicopata ou que muito simplesmente me ouça sem abanar a cabeça.

18 de janeiro de 2009

Incompreendido

Comentei com um amigo o que sonhara na noite anterior, o berro, os vidros, o horror dos sons. A ainda incredibilidade por não me ter apercebido que era de mim que provinham. O rasto, muito curto, de um sonho em que apenas conseguira visionar o final, e em que parecía que me tornara espectador de mim mesmo.
Perguntei-lhe se já tinha passado pela mesma experiência.
Riu-se, disse-me que tinha de deixar de fumar coisas esquisitas...
Encarei-o e falei-lhe na seriedade da questão, o quanto isto me perturbava, que mesmo com o passar dos anos nada nos meus sonhos se tornara mais leve ao contrário do que os profissionais sempre me havíam garantido.
A resposta que me deu foi desconcertante: Acorda com o seu próprio ressonar quando se engasga.

17 de janeiro de 2009

Sons

Deitei-me cedo, li um pouco e quando comecei a sentir as pálpebras a pesarem encostei o livro e apaguei a luz.
Creio ter adormecido quase de imediato, pois quando acordei ainda estava deitado para o mesmo lado.
O que me despertou foi o som de vidros a escaqueirarem-se e um grito que me fez sentir um arrepio ao longo da espinha. Senti o coração disparado. Depois um aperto pelo horror do berro. Fiquei à escuta, atentamente, à espera de ouvir vozes, barulho de gente a movimentar-se. Nada. Um silêncio profundo.
Não sei quanto tempo passou até acordar novamente, o mesmo grito, os vidros naquele tom gélido que fazem quando se partem.
Sentei-me na cama.
Achei impossível que viesse a quietude a seguir a tamanho ruído. E nada. Nada mesmo. Nem o som de estores a subirem, a vizinhança à cata da origem de tal barulho a rasgar a noite.
Permaneci na escuridão e sentado alerta.
Lá fora apenas uma bulha de gatos, os miados de quem chama a parceira, recordei o Janeiro. Ainda assemelhei a gritaria dos felinos ao som terrível que ouvira mas... não era de todo a mesma coisa.
Gelado, cobri-me e já de olhos fechados achei que no dia seguinte alguém comentaría o facto e eu ficaría a saber o que se passara.
Quando pela terceira vez ouvi aqueles sons de paralisar ainda vi no meu pesadelo, que era eu que me cortava numa janela.

16 de janeiro de 2009

Sonambulismo

O sonambulismo é um transtorno classificado como uma parassonia do sono, também chamado noctambulismo, durante o qual a pessoa pode desenvolver habilidades motoras simples ou complexas. O sonâmbulo sai da cama e pode andar, urinar, comer, realizar tarefas comuns e mesmo sair de casa, enquanto permanece inconsciente e sem possibilidade de comunicação.

É difícil de acordar um sonambulo mas, contrariamente à crença popular, não é perigoso fazê-lo. O sonambulismo ocorre durante os estágios do sono 3 ou 4, chamados sono de ondas lentas (SOL).

É mais comum em crianças e adolescentes. Habitualmente, são episódios isolados, mas pode ter um carácter recorrente em 1-6% dos pacientes. A sua causa é desconhecida e não há tratamento eficaz.

Acredita-se, erradamente, que o sonambulismo é a conversão, no estado de vigília, dos movimentos que o indivíduo efectua durante o sonho. Mas na realidade o sonambulismo ocorre antes do estágio de movimentos oculares rápidos.





in Wikipedia

15 de janeiro de 2009

Ela na rua

A rua. Desço-a como sempre, aquele vento que não se ouve e que enfuna o casaco, as calças, leva a gravata. Desço a rua no passo de quem segue apressado e no entanto não sei ao que vou. Os propósitos do meu caminhar alertam-me que é necessário que vá depressa, tudo parece atrasado nesta marcha.
Não há mais ninguém. Pergunto-me porque estou só e se é este deserto de pedra e betume qual a urgência...
À medida que ando apercebo-me com uma nitidez perfeita das folgas entre o desenho da calçada, são tão nitidas como se estivesse rente a este calcário frio, pardo, mais escuro, cinzento. É sempre tudo cinzento. Um cinzento que me dá pena, faz-me sentir triste, mas é tristeza por dentro, daquela que não se consegue explicar e aperta.
Do outro lado do passeio vejo um vulto, mas como estou com pressa não posso parar.
Continuo sempre e de cabeça voltada para trás tento aperceber-me sobre a identidade de quem passa, cada vez mais distante. É um homem vestido de negro que transporta um quadro enorme, do seu tamanho, um retrato de uma mulher.
Apuro a vista. Observo o retrato com a mesma limpidez com que vejo os espaços entre as pedras da calçada.
É ela, a mulher do retrato.
Segue, o retrato sorri para mim, torna-se muito vermelho, encandeia no meio deste cinzento todo.
Grito, chamo pelo homem que o transporta, mas não sai som da minha garganta. Esforço-me, forço, insisto e em ondas de som com espaços entrecortados a minha voz propaga-se em rolos.
Quando atinge o homem, a mulher do retrato, é inaudível.
Acordo e volto-me de lado, encolho-me, junto os braços ao peito em cruz, os pés sobrepostos em cruz. Assim permaneço até me levantar para o dia.

14 de janeiro de 2009

Domus

A máquina de lavar sempre que entra no ciclo da centrifugação, parece confrontar-se com um tiroteio. Dá um solavanco e depois gira num ruído tremendo do que se assemelha a vários disparos. Temo que um dia destes avance, se desloque do seu lugar, me persiga cozinha fora. Resumindo: Se avarie de vez.
Enfrentei-a corajosamente.
O tambor revolteava-se furiosamente, toda a estrutura branca a vibrar e os pequenos botões a acenderem intermitentemente uma luzinha vermelha.
Mantive a minha postura, encarei-a para lhe fazer ver que não a receava, eu sou o dono da casa, da cozinha, dela.
Avançou deslizando grotescamente para mim, enviuzada, ofendendo-me de quina, mirando-me desafiadoramente nos seus leds incendiados. Ficámos a medir forças e num repente ela deu um salto e tentou atacar-me.
Foi com uma agilidade enorme que me encavalitei no seu topo, cavalguei-a, os calcanhares apertando toda a estrutura metálica branca, dobrado, vergado e selado como uma verdadeira montada.
Feliz da minha supremacía vi-me como um genuíno cowboy domesticando um touro mecânico.
Divertía-me!
E depois já era a batedeira e a seguir a torradeira e até a máquina expresso!
Todas elas eu montei e dominei habilmente, era-me possível ser o vaqueiro de todos os electrodomésticos fosse qual fosse a sua dimensão.
Despertei com um sorriso... agarrado ao lençol e ao edredon como rédeas que se seguram na arte de bem cavalgar. Durante todo o dia assaltou-me a lembrança deste sonho e fez-me rir baixinho.
Eu sei que é um sonho, mas fiquei contente comigo mesmo!

13 de janeiro de 2009

Aflições da natureza

Levantei a tampa da sanita e ouvi a urina a caír na água, um ruído certeiro. A mão direita espalmada nos ajulezos da parede em frente, à distância do comprimento do meu braço. Uma sensação boa de alivio, constante. Tão constante que não paráva o fluxo. Olhei-me, nada de estranho, apenas o liquido a saír sempre com a mesma intenisdade, não paráva. Comecei a perguntar-me onde tería tanto para vazar tanto. E aquilo sempre a saír.
Foi quando a minha mão direita começou a enterrar-se na parede como areia movediça. Uma parede mole que me engolía lentamente a mão, o pulso, começava a desaparecer o cotovelo.
E eu naqueles preparos, sem parar o que constante lá saía alinhado num leve arco e atingía a poça de água no fundo da sanita.
Reparei então que era a minha própria urina que desfazía a base da parede de azulejos onde se encostava a sanita, a ía desgastando aos poucos, corroendo e esboroando.
Afligi-me: se fazía aquilo à parede que acontecería se me tocasse na mão que segurava o membro? Se pingasse para os pés?
Larguei o pénis. Mas este descontrolado sem a guia de mão esguichou ao redor e conforme a urina se espalhava ía golpeando tudo.
Rachas nas outras paredes, as minhas calças cortadas e o braço afundado na parede semi-demolida restava num coto perto do ombro.
Acordei.
Sem ter a certeza de o estar.
Verifiquei como estava o meu corpo, se nada me faltava, espreitei para dentro dos boxers.
Deitei-me e lá adormeci. Com uma bexiga do tamanho da de um porco. Até de manhãzinha.

12 de janeiro de 2009

Almofadas

É incrível o que um pequeno pedaço de espuma, penas, sumauma, o diabo que está lá dentro de uma almofada consegue fazer a alguém que tenta conciliar o sono. Ou seja, tira-lhe o sono, a mim foi-se, puf!
Em quarto de hotel tudo é estranho, mesmo nos estrelados, e as férias que fiz no final do ano a romper este trouxeram-me a angústia da 1ª noite em branco.
Nada na cama macia, fresca e perfumada se me aconchegava ao corpo. Embora algures, se pudessem escutar alguns sons de quem muito se aconchegava... de inicio achei piada, mas a repetição trouxe-me o aborrecimento e nem de cabeça coberta consegui abafar os ruídos.
Depois a almofada. A Almofada. A maldita almofada sem corpo, chatinha como uma folha. Soquei-a, empurrei o que tinha lá dentro para um canto e encaixei-me numa nesga do que restava.
Nada.
Uma insónia longa e dolorosa.
Suspirei pela minha cama, pelo meu travesseiro, até pelos meus pesadelos.
Pelas cinco da manhã decidira já que à hora do pequeno-almoço faría a mala e voltaría para casa, aquilo não eram férias, era tortura.
Acordei com a empregada de quartos a perguntar se podía fazer a limpeza...
E não voltei a usar a almofada.