29 de novembro de 2008

Labirinto

Passeio-me num jardim luxuriante, as árvores altissímas ondulam brandamente ao sabor de uma brisa morna que me envolve. Cheira bem. Os canteiros estão geometricamente floridos por escala de cores, desde um roxo profundo de amores-perfeitos até ao branco de copo de leite de umas rosas tão abertas como pratos.
Até o chão se cobre de uma relva como nunca vi tão verde.
Tudo é belo, arrumado e limpo.
Intencionalmente entro num labirinto feito de arbustos recortados de figuras humanas. São gigantescas e perfeitas.
Aventuro-me, não receio perder-me pelas várias saídas enganosas, sei o caminho para saír.
Ao roçar numa curva para outro corredor, sinto puxarem-me o braço. É uma mulher de vestido branco, comprido, cabelo até aos pés que vai arrastando pequenas folhas que tombaram dos arbustos. Ri-se. Uma gargalhada bonita a cortar o silêncio. Pergunto-lhe como se chama mas só se ri. Reparo então que tem os olhos vendados, tento tirar-lhe a venda mas ela não deixa e continua a rir-se.
Puxa-me por um braço e leva-me para dentro dos arbustos de figuras humanas. Arranho-me nos galhos, sinto a cara a arder das vergastadas dos ramos mais flexíveis que ela larga na passagem à minha frente. Peço-lhe que páre, que nos vamos perder, mas ela prossegue, cada vez mais distante de mim e sempre a rir.
Guio-me pelo rasto que o seu cabelo deixa mas tenho medo de o pisar e de a magoar.
De repente tudo desaparece: o intrincado caminho, os cabelos longos, a mulher, o seu riso.
Encontro-me num descampado ermo, sem vegetação alguma, apenas terreno pedregoso e terra muito escura. Caminho com cuidado, nuvens de pó levantam-se, parecem cinzas.
Encontro a venda da mulher.
Não sei porquê coloco-a. Não vejo nada. Grito. Grito ainda mais e tento arrancar o pano que me cega mas não sou capaz.
Acordo engasgado com a minha própria saliva, coberto de suor, a almofada e o sitio onde me deito húmidos de transpiração.
Levo o resto da noite a tentar decifrar o que sonhei. Sinto que este sonho se relaciona com alguma coisa que passei mas não me consigo lembrar.

2 comentários:

Teresa Durães disse...

talvez os olhos vendados escondam a transparência do olhar

X disse...

a Teresa Durães tem toda a nossa simpatia.
Reiteramos a sua afirmação