26 de novembro de 2008

O rei dos bolos

A mesa, enorme, prolongava-se para além do que a minha vista conseguía alcançar.
As iguarias eram quase todas doces, bolos monumentais e altos como os de uma festa de casamento. Muitos arranjos de flores, alguns altos como árvores plantadas na toalha branca. Mas eu vislumbrava todos os que se lambuzavam à minha mesa e incitava-os a comer, a provar disto e daquilo, a enterrarem os dentes nos bolos cheios de cremes brancos e rosados, uma profusão de chocolates, cheiro de baunilha, morangos grandes como maçãs que parecíam ter sido envernizados tal era o brilho.
Eu no topo da mesa. Bastava-me desejar, imaginar qualquer tipo de pastelaria e ela logo aparecía, um odor adocicado que embebedava.
A servir os meus convidados, criados de peruca, uma farda comestível que eles próprios oferecíam como cartão de visita a quem ía aparecendo.
Tudo me parecía normal, razoável, eu dono e senhor de um castelo feito de açúcares como a história infantil. Mas sentía-me a salvo de bruxas e de todo e qualquer mal. Eu era rei.
Eu próprio coroado de nogat.
Todos me adoravam, lambíam-me as mãos doces, os anéis de pedras preciosas, os punhos de renda, a jaqueta.
Acordei. Fiquei muito sossegado.
Perguntei-me porque razão sonhara com doces, bolos, confeitaria, eu que nem sou apreciador de tais coisas...
A imagem de um rei lambido deu-me um enjoo e achei-me detestável em tal soberania.

Sem comentários: