10 de novembro de 2008

Azares

Depois de uma noite sem sonhos, sem paragens, sem sobressaltos sobreveio na seguinte o olhar desperto.
Não me sentía ansioso. Apenas não conseguía dormir.
É nestas ocasiões que tudo nos vem à lembrança, que ouvimos com profunda nitidez os barulhinhos da casa, dos vizinhos, da rua.
Como o tempo passou e eu nada de adormecer resolvi inverter a minha posição e mudei-me, ficando os pés na cabeceira, barriga para cima. Nada. Experimentei de lado, do esquerdo e do direito. Depois arrefeci e voltei para debaixo das mantas, achando que dormir para os pés era uma parvoíce. De barriga para baixo. Comecei a desesperar, soquei a almofada, tive calor, tirei o casaco de pijama. Ainda me lembrei que era capaz de sentir frio pela noite fora...
Caminhava descalço, o chão gelado, os olhos sempre postos nos pés.
Adiante vi um monte de notas, moedas, apressei o passo, fiquei contente, tanto dinheiro!
Mas quando me agachei para lhe deitar a mão fiquei horrorizado: estavam envolvidas em fezes!
Recuei.
Senti nojo, repulsa. E um ódio tremendo por ver a minha sorte ali na merda!!!
Tive então uma idéia!
Olhei para todos os lados e não havía vivalma. Tirei as calças de pijama e embrulhei-as à mão para agarrar o dinheiro. Todo nú.
Lembrei-me do casaco de pijama, senti um arrepio que me gelou o sangue.
Mais à frente um outro amontoado de notas. E ainda outro, e mais, e cada vez vez mais e maiores!
Sempre escondidos na mesma sujidade que crescía à medida da altura das notas.
E eu sem mais nada para lhes pegar.
Acordei.
O lençol embrulhado no braço, à volta do pescoço, os pés descobertos.
Senti um vómito subir-me das entranhas.
O resto da noite dormi de janela aberta com um cheiro nauseabundo que não me largou o nariz.

2 comentários:

pront'habitar disse...

mas, apesar de tudo, adormeceste...

Teresa Durães disse...

engraçado, apesar de não sonhar com notas entoladas em merda, sonho muitas vezes com esse dinheiro