Tive um serão agradável: Um grupo de antigos colegas juntamo-nos, como o fazemos todos os anos pela Primavera. Falamos do tempo de escola, de Coimbra, das republicas, é assunto obrigatório e recorrente. Falamos do que fazemos actualmente, dos que não apareceram, especulamos, rimos, comemos e bebemos. No final, os fados de capa negra.
Regressei a casa com uma paz imensa e a trautear o que ouvira.
Recolhi-me e ferrei no sono.
Destaparam-me, puxaram-me por um pé e caí redondo no chão.
Toda a entrada do quarto estava vedada por uma barreira de homens enormes envoltos em capas negras. Um som de capela silvou e eu tapei os ouvidos, fechei os olhos, mas à medida que o entoar se mantinha estável, modulado, quase palpável comecei a sentir uma admiração enorme por quem cantava.
No meio deles, o meu colega de escola, o miúdo de calções, joelhos feridos, a imagem cinzenta no seu todo. Lembro-me de lhe ter pedido desculpa por não o procurar. A voz dele elevou-se à dos outros. Até se extinguir o som e a sua figura cinzenta.
Acordei tranquilo, uma sensação de perdão, o coração calmo.
Vou procurar o meu amigo de infância, devo isso a mim mesmo.